Grupo Focal Como uma Estratégia para Coletar dados de Pesquisa em Enfermagem

Lucia Beatriz Ressel, Dulce Maria Rosa Gualda, and Rosa Maria Braccini Gonzáles.

Lucia Beatriz Ressel, Enfermeira, Mestre em Enfermagem Departmento de Enfermagem, Universidade Federal do Santa Maria, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil.

Dulce Maria Rosa Gualda, Obstetriz, Doutor em Enfermagem, Professor Associado, Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiática da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, Brasil.

Rosa Maria Braccini Gonzalez, Enfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Adjunto, Departmento de Enfermagem, Universidade Federal do Santa Maria, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil.

Resumo:

Este artigo relata a experiência da utilização da técnica de grupo focal para coletar dados de pesquisa em enfermagem. Foram realizados cinco grupos de discussão, nos quais o tema foi sexualidade na prática da enfermagem. Participaram da atividade um grupo de sete alunas de graduação em enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), em agosto e setembro de 2001. Neste artigo é descrita a motivação, a justificativa e o processo e o resultado deste estudo piloto.

Palavras chave: grupo focal, pesquisa em enfermagem, sexualidade, cultura.

 

Citation information:

Ressel, L. B., Gualda, D. M. R., & Gonzalez, R. M. B. (2002). Grupo focal como uma estratégia para coletar dados de pesquisa em enfermagem. International Journal of Qualitative Methods 1 (2), Article 5. Retrieved DATE from http://www.ualberta.ca/~ijqm


O impulso inicial

Ao iniciarmos uma pesquisa é comum sentirmos uma certa apreensão no que se refere à pertinência da técnica de coleta de dados. Várias indagações surgem permeando o pensamento do pesquisador, tais quais: Essa técnica será adequada aos objetivos e objeto de estudo desta pesquisa? Será que ela vai permitir a revelação dos dados adequadamente? Será que ela é aplicável ao grupo com quem se pretende trabalhar? Como será sua viabilização na prática? Será suficiente para coletar os dados? Como e quando deverei associar outra técnica para os refinamento e aprofundamento dos dados?

E foi buscando a técnica de coleta de dados apropriada para tal fim que desenvolvi, num projeto-piloto, um exercício com a técnica do grupo focal, a qual será relatada neste artigo.

Em minha tese de doutoramento na Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, o ojetivo do estudo é investigar de que maneira a sexualidade é vivenciada na área assistencial e de ensino na enfermagem, enquanto componente cultural.

Assim, em razão deste objetivo, que exige uma análise cultural é que a antropologia dá o apoio para sua concretização, sendo que nesta ciência foi encontrado o maior impulso para optar pela técnica do grupo focal na coleta de dados. Dentre as justificativas, podemos pontuar ,em primeiro lugar, que tem sido utilizada com bastante freqüência na área, sendo apropriada a pesquisas qualitativas, onde se pretende explorar um "foco", ou seja, um ponto em especial. Em segundo lugar porque pode ser empregada, tanto em tema específico, cuja finalidade é deixar emergir as diferentes visões sobre o mesmo, ou ainda com um grupo, para se apreender as diferentes visões de mundo ou de determinados temas, ou mesmo quando se quer entender em profundidade um comportamento dentro de um grupo determinado (Victora, Knaut, & Hassen, 2000). Finalmente deve-se considerar que possibilita, por meio de um fórum de discussão, a construção de um conhecimento coletivo do grupo.

E, se em áreas, como a mercadologia, onde inicialmente se originou, e outras como a psicologia e a antropologia (Westphal, Bogus, & Faria, 1996), que tem sido utilizada com sucesso para coleta de dados, tanto em pesquisas qualitativas como quantitativas, na enfermagem essa é uma nova opção, pois ao mesmo tempo que permite ao pesquisador obter dados para seus estudos, garante aos pesquisados um espaço de reflexão de suas próprias concepções, de uma auto-avaliação, o que possibilita a mudança de comportamento. Nesta pesquisa, o objetivo é a revelação das diferenças e das diversidades existentes no mesmo contexto. Todavia, a cultura é um elemento dinâmico está sempre se transformando proporcionando mudanças internas nos grupos sociais e em cada indivíduo e um fórum de discussão acerca da sexualidade, enquanto um componente cultural, possibilita condições para transformações. É importante a possibilidade de que, tais propostas de mudança, possam emergir do próprio grupo de estudo, sustentadas pelo próprio contexto de suas vivências.

Este artigo trata do relato da experiência de um estudo piloto realizado para se avaliar a viabilidade da proposta de técnica de coleta de dados. Este foi desenvolvido junto a um grupo de sete alunas de graduação do Curso de Enfermagem, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no período de agosto e setembro de 2001.

A construção do grupo ... ou "o enamoramento"

Inicialmente, contatei com uma colega do Departamento de Enfermagem da UFSM, a qual atualmente desenvolve atividades junto a grupos para agendar uma reunião com um grupo de alunos interessados em participar em pesquisa e núcleos de estudo na área da saúde da mulher.

Nesta reunião, procurei explicar o mais claramente possível sobre o que tratava meu projeto de tese de doutorado, qual seria o tema desenvolvido, a técnica que utilizaria, o motivo deste projeto-piloto.

Esse primeiro contato foi fundamental para a adesão ao grupo que deve ser esclarecido quanto aos objetivos e metodologia que serão desenvolvidos (Minayo, 1993).

"O enamoramento"

O grupo mostrou-se bastante interessado e num primeiro momento 13 alunas inscreveram-se para participar. Após as devidas explicações acerca do trabalho combinamos a data do primeiro encontro e solicitei-lhes o número de um telefone para contato.

A seleção das participantes do grupo focal deve ser bastante criteriosa e a mais específica possível, uma vez que pessoas muito diferentes podem influenciar a discussão inibindo-a, ou criando constrangimentos (Barbosa, 1998; Dall’Agnol & Trench, 1999). A amostra deve ser intencional, determinada pelo objetivo do estudo num grupo o mais homogêneo possível. Considerando estas recomendações a participação de colaboradoras foi vinculada, à existência de, pelo menos, um traço comum entre elas.Dessa feita, os critérios de seleção foram: sexo feminino e aluna de graduação do Curso de Enfermagem da UFSM. As demais variáveis como idade, origem étnica, estado civil, religião, classe social, foram consideradas, neste momento, como fatores que viriam enriquecer o grupo, pela oportunidade da revelação das diferençaa. A composição final do grupo foi de 07 participantes.

Neste grupo a idade variou entre 17 e 24 anos. A maioria era solteira, havendo uma aluna divorciada. A religião predominante foi a católica e a espírita em menor representatividade. A origem étnica variava entre a alemã e a italiana. Elas estavam no 4º e 5º semestre do Curso de Enfermagem, não havendo portanto, ainda vivenciado a disciplina de Enfermagem Materno-Infantil, que trata especificamente sobre temas de saúde da mulher e neste, sobre sexualidade feminina e, que é oferecida no 6º semestrre. Portanto, todas as participantes possuíam seus pontos de vista acerca dos assuntos que foram discutidos, a partir de suas vivências individuais dentro da sociedade.

Foram realizados 5 encontros de sessão grupal de discussão sobre o tema sexualidade feminina, cada qual com um objetivo e uma metodologia específica.A duração de cada um foi de 1 hora e 30 minutos, sendo marcado o horário conforme a solicitação das participantes.Houve o cuidado de respeitar o início e o término do horário previsto, seguindo a orientação dos autores (Barbosa, 1998; Dall’Agnol & Trench, 1999), sendo este cuidado estendido a todas as colaboradoras através do contrato grupal de trabalho.

Todas as narrativas e discussões foram gravadas em fita cassete e transcritas após os encontros. Ficou estabelecido com as colaboradoras que após a textualização dos debates, elas validariam os textos.

A preparação dos encontros... ou "a montagem do espetáculo"

Na véspera do primeiro encontro agendado foi feito contato telefônico com cada uma das colaboradoras, confirmando o horário e o local da sessão.

Cada encontro, ou espetáculo teve uma preparação especial, de acordo com o objetivo e a metodologia que seria utilizada. Houve alguns cuidados que permearam todas as sessões no que diz respeito ao ambiente.Na sala havia boa iluminação, ventilação, cadeiras estofadas e espaço adequado para a realização das técnicas. Sua localização permitiu desenvolvermos os encontros sem interferências externas. Houve preocupação em assegurar a privacidade, conforto, fácil acesso e ambiente neutro (Victora, Knaut, & Hassen, 2000). Por outro lado, buscou-se proporcionar um ambiente agradável, carinhoso, descontraído, utilizando-se de incenso perfumando levemente a sala, de uma música relaxante, com sons de água, natureza, pássaros, caixa de música, como "Os Clássicos de Ênia", "Love Songs e "Beatles For Songs". A disposição organizei numa mesa uma pequena merenda, composta por biscoitos ou doces e salgados, ou bolo, ou bombons, ou balas, e um chá de frutas ou ervas, para que ao longo dos debates todas fossem saboreando as guloseimas. Isso tornava o momento mais descontraído e aconchegante.

As cadeiras eram posicionadas em círculo e a cada encontro mudávamos nossa posição neste. Sentávamos em um lugar que possibilitava nossa comunicação não-verbal, através do olhar, assim como evitávamos lugares uma ao lado da outra para não provocar idéia de centralização. O arranjo dos assentos é importante, devendo promover a participação de todos, a interação face a face, um bom contato ocular entre todos os participantes, ou seja, distâncias iguais entre todos, e dentro do mesmo campo de visão. Não se deve evitar atribuir aos assentos uma idéia de prestígio, ou que algum colaborador sente sempre ao seu lado (Dall’Agnol & Trench, 1999; Débus, 1997).

No primeiro encontro houve a distribuição de crachás identificando cada participante, de acordo com a recomendação para que fossem nomeados adequadamente e facilitassem sua interação no grupo (Dall’Agnol & Trench, 1999).

Em alguns encontros optei pôr empregar algumas técnicas comente utilizadas em oficinas didáticas, entre elas as técnicas de colagem e de modelagem em argila. À medida que as participantes expressavam seus sentimentos e concepções através das técnicas, iam explicando, argumentando e criando "naturalmente" a discussão. Estes recursos didáticos, portanto, foram usados, para incentivar e deixar fluir espontaneamente a temática, que se encontra veladamente encoberta, sendo difícil de ser expressada verbalmente. Além disso, como enfermeiras, nosso objeto de trabalho é o cuidado de pessoas e, para tanto a sensibilidade deve permear nosso fazer, estendendo esse entendimento à pesquisa. Por outro lado é cuidar de quem está participando conosco de uma investigação científica, proporcionando ambiente aconchegante, relaxante, carinhoso e ao mesmo tempo oportunizar a revelação dos debates de maneira criativa e descontraída.

Ao final de cada "espetáculo" agendávamos o horário e o dia da próxima sessão grupal, e na véspera deste dia contatava via telefone com cada participante confirmando o encontro e sua presença.

Estes momentos prévios, de preparação dos encontros, comportavam alguns pequenos detalhes que propiciavam um clima de aconchego, refletindo positivamente no processo de interação grupal. Ao mesmo tempo, oportunizava um espaço de relaxamento e de confiança no que estava sendo construído, refletindo num clima de serenidade e segurança para o desenvolvimento das sessões.

O 1º encontro: "buscando compreender os significados"

O objetivo deste "espetáculo" foi investigar os significados e as percepções sobre sexualidade entre os participantes.

Para tanto utilizei como técnica inicial a "explosão de idéias" e foi colocada a questão: Qual a primeira idéia que lhe vem a mente quando se fala em sexualidade?

Foram surgindo aos poucos algumas concepções tais quais: sexualidade como sinônimo de sensualidade; como uma forma de contato entre as pessoas; como relacionamento interpessoal; como algo comum a todos os seres humanos e conduzida por hormônios; como uma energia que existe dentro de cada indivíduo; como um elemento de atração entre as pessoas.

Ao mesmo tempo era relacionada a questão da sexualidade com os valores e as concepções culturais de cada indivíduo, e em tempos e espaços específicos, salientando-se, através de exemplos, que o significado de sexualidade varia conforme a cultura de cada grupo social.

Para esclarecer as idéias lançadas pelo grupo, eram usadas perguntas conduzidas pela tríade: o quê? para quê? por quê?. Solicitava que exemplificassem suas idéias e fazia outras indagações, que buscavam aprofundar a discussão e esclarecer suas falas (Dall’Agnol & Trench, 1999; Débus, 1997). foram colocadas as questões: Como mulher, como você expressa sua sexualidade no dia-a-dia? Solicitando que dessem exemplos de como isso acontece, quando acontece, como se sentem, etc...

Surgiram então explicações como: "Tem a ver com atração e com atenção", se referindo ao convívio com as pessoas e a inter-relação que se desenvolve; "a maneira de se vestir, de gostar ou desejar se arrumar"; na maneira de agir e "movimentar o corpo", isto é nas expressões não-verbais deste; no "toque" como uma forma de contato, de expressão de carinho, de aconchego, de cuidado e proteção; no "jeito de olhar, falar e participar no mundo".

Embora com um pouco de dificuldade para expressar teoricamente o significado de algo vivenciado no cotidiano de cada uma, tinham um entendimento de sexualidade como algo inerente a todo ser humano, que se expressa em todas as formas de comunicação corporal e tem um significado variável conforme a cultura de cada indivíduo.

A sexualidade, é uma unidade autônoma e entidade universal de todo ser humano, porém dependente de determinado contexto cultural. Depende de elementos balizadores (como origem étnica, história familiar, etapa do ciclo da vida em que se encontra, relações de gênero estabelecidas no universo em que vive) para o processo de modelação da subjetividade do eu (Débus, 1997). Neste primeiro encontro que embora fluíssem opiniões e idéias acerca do tema, isto acontecia com certa dificuldade. Foi feita uma apreciação sobre o encontro e elas expressaram claramente a dificuldade em teorizar essa questão, mesmo sendo a sexualidade um aspecto vivenciado no cotidiano de suas vidas. Relataram que, em nenhum momento anterior havia sido exercitada essa prática, mas que acharam importante essa oportunidade, até como uma auto-análise de seus conceitos e suas vivências.

Considerou-se, neste momento que seria adequado usar pequenos textos, ou frases que trouxessem conceitos de sexualidade perseguidos neste trabalho, uma vez que isso funcionaria como elemento facilitador e incrementador do debate.

Após foi entregue a cada colaboradora uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual foi , também, assinado pela pesquisadora.

O 2º encontro: "Construções Singulares"

Teve como objetivo investigar como se deu a construção cultural sobre a sexualidade das colaboradoras.

Foi solicitado, inicialmente, para que falassem sobre como a sexualidade era tratada na convivência em família, na escola, e por outras instituições sociais que exercem influência na socialização dos indivíduos, como por exemplo a igreja, os meios de comunicação de massa..., na infância e adolescência. Nas situações exemplificadas elas referiram-se a sexualidade como um conceito restrito a relação sexual.

A partir de então buscou-se aprofundar as narrativas pedindo esclarecimentos, conferindo se meu entendimento sobre os relatos era pertinente, solicitando comparações, e com isso elas mesmas foram estendendo esse conceito para outras perspectivas.

Surgiram vários e diferentes depoimentos sobre como foi sendo, e é construída a sexualidade em suas vidas. Em síntese podem ser agrupados da seguinte maneira: a sexualidade ser considerada um tabu, havendo pouco ou nenhum diálogo a seu respeito na família; a sexualidade ser expressada, através do relacionamento afetivo no cotidiano familiar; ser o domínio da sexualidade um tema de orientação aos filhos, sendo esse papel legado à mãe, porém realizado de forma fantasiosa, como alerta e proibição, à semelhança do que foi encontrado na dissertação de Sobre a cultura como mediadora da sexualidade feminina, realizado junto a um grupo de mulheres rurais, no interior do Rio Grande do Sul (Ressel, 1995).

Muitos depoimentos revelaram que foi com o acontecimento da menarca que o tema da sexualidade começou a fazer parte das conversas com os pais. A menarca foi também um motivo para que várias colaboradoras fossem levadas pelos pais ao ginecologista pela primeira vez, inclusive sendo solicitado a este profissional que as orientasse a respeito de menstruação e desenvolvimento do corpo.

Outra instituição que influenciou nessa construção, segundo seus relatos, foi a escola, e de forma positiva, principalmente a disciplina de ciências por volta da 4ª a 6ª série que promovia momentos de diálogo e informação, ou através da indicação de livros pelas professoras. Em outro trabalho este dado foi encontrado diferentemente. A escola, como agência educativa pouco contribuiu para a aprendizagem sexual do grupo em estudo, e quando o fez foi carregada de preconceitos e de forma eventual, não tendo caráter permanente nos currículos, além de deter suas informações somente sobre partes do corpo humano, menstruação e gravidez, advertindo sempre para os riscos do sexo (Heiborn, 2000).

Nos relatos foi marcante a presença de uma diferenciação de condutas masculinas e femininas quanto à sexualidade, dentro do ambiente familiar, havendo maior liberdade aos homens e maior controle às mulheres. Em outro estudo (Ressel, 1995) , esse comportamento esteve presente nos dois grupos, que embora distintos quanto à idade e espaço geográfico, se assemelharam. Neste sentido, a origem étnica foi um elemento balizador importante na construção da sexualidade das colaboradoras, em ambos trabalhos (Heiborn, 2000).

Nesse segundo algumas questões foram ser encaminhadas de forma diferente, para evitar relacionar limitadamente o conceito de sexualidade ao de ato sexual, assim como possibilitar estender este conceito ao universo de valores e regras culturais que vão sendo aos poucos instituídos na socialização.

O 3º encontro: "A enfermeira que eu vejo"

Teve como objetivo possibilitar a revelação do estereótipo de enfermeira entre as colaboradoras. A técnica usada foi a de colagem de figuras e palavras de revistas e solicitei que elas representassem "como eu vejo a enfermeira (a imagem de enfermeira)"? ou "como é a enfermeira com quem convivo?"

A partir daí elas tiveram 45 minutos para montar os cartazes, e após cada uma fez sua explanação, de onde emergiu uma diversidade de características imputadas à enfermeira, sendo várias dessas características expressadas por elas como "aquelas características fundamentais que a enfermeira deve ter".

Os resultados foram agrupados em 5 grupos distintos pelas suas características e para serem apresentados de uma forma simples e prática

Como características afetivas consideraram: ser acolhedora, apoiadora, solidária, saber compartilhar sentimentos, ser alegre, carinhosa, delicada, sincera, humilde, tranqüila e serena.

Como características técnico-cognitivas referiram: ter competência técnica, ser ótima observadora, ter conhecimento científico, ser criativa, ágil, precisa e dinâmica.

Como características ético-políticas enfatizaram: possuir pensamento crítico, ser reflexiva, ou seja, refletir sobre todos seus atos constantemente, ter visão política, pautar sua conduta pela ética, saber trabalhar em equipe, ter respeito pelo trabalho e pelo local de trabalho e respeitar a cultura (como valores e regras culturais) das pessoas.

Como características vocacionais entenderam: gostar do que faz, ter satisfação com o que faz, ter prazer de fazer seu trabalho, ter amor pela profissão, ter vocação, ser uma luz às pessoas, ajudar sempre, viver em harmonia com a vida, ter força de vontade, ser batalhadora, forte, lutar por um ideal, lutar por um sonho, ter fé, acreditar em algo superior a nós.

Como características relativas a apresentação pessoal salientaram em quase todas as falas o cuidar de si fisicamente, com exercícios e hábitos saudáveis de vida, bem como com uma boa apresentação pessoal e cuidados específicos com a beleza física, porém discreta e com capricho nas roupas e enfeites (usados com "bom senso").

Somente em uma das representações foi revelada a questão da sexualidade presente na imagem da enfermeira, numa condição à semelhança do imaginário popular que relaciona a imagem da enfermeira ao pecado, à sensualidade e ao erotismo.

Nas demais representações esse domínio ficou velado, não sendo entendido pelo grupo como elemento de expressão para caracterizar a imagem que possuem a respeito da "enfermeira", até porque a imagem que reproduziram reflete o que elas entendem como positivo e bom, e que desejam possuir no futuro como enfermeiras também.

No entanto, a questão da beleza física, da apresentação pessoal agradável mas sem exageros, foi expressada por várias colaboradoras, relacionando esta característica a um predicado necessário para desenvolverem seu trabalho a contento.

Isso vem ao encontro da afirmação de que as enfermeiras denegam sua própria sexualidade, ou seja, omitem as lembranças desta como um mecanismo de auto-controle, sendo isto transmitido na extensão da prática e da formação da enfermeira, tornando-se vitalício nas pequenas e corriqueiras situações de vida desta, e na expressão de sua própria imagem, conforme demonstrado neste exercício de pesquisa (Sobral, 1994; Figueiredo & Carvalho, 1999).

Frente a essa situação, que revelou o domínio da sexualidade ausente na imagem de enfermeira, pareceu pertinente relacionar duas possibilidades. Uma interpretando-a como uma dificuldade da própria expressão da sexualidade pelas enfermeiras, em concordância com as autoras citada acima. E outra questionando se a pergunta norteadora, utilizada nesta técnica para a elaboração da representação da imagem da enfermeira foi suficientemente explícita para conduzir uma representação que contivesse um indicativo a respeito da sexualidade.

Em caso negativo, se a questão não foi clara o suficiente, oportunizando outras interpretações em detrimento a esta, a questão poderia ser reformulada para: "Como é que a sexualidade transparece no dia-a-dia da enfermeira?" ou "Em que situações são revelados elementos relativos a sexualidade no dia-a-dia da enfermeira?"

Entretanto, neste momento, as características apontadas pelas colaboradoras, através da técnica de colagem, atendeu ao objetivo do encontro, que era possibilitar a revelação do estereótipo de enfermeira junto a este grupo de alunas de graduação em enfermagem.

Cabe salientar que esse exercício permitiu apontar a necessidade de criar mais um encontro que objetivasse especificamente revelar situações em que a sexualidade é um elemento presente e visível na prática da enfermagem.

O 4º encontro, nominado "como tratar esse tema nessa casa?"

Teve dois objetivos. O primeiro pretendeu dar continuidade ao debate do 3º encontro na busca de suprir o hiato sobre sexualidade na imagem da enfermeira representada nos cartazes das colaboradoras. E o segundo, discutir como a questão da sexualidade tem sido conduzida no Curso de Enfermagem da UFSM, e propor sugestões ou estratégias de trabalho para o seu encaminhamento neste curso.

O debate para atender ao primeiro objetivo ocupou os 30 minutos iniciais do encontro e foi motivado com a pergunta: "Como você percebe a questão da sexualidade em sua representação sobre a imagem da enfermeira?"

Durante a discussão o próprio grupo deu-se conta de que este domínio não foi expressado por elas e que não é expressado explicitamente pelas enfermeiras.

Em algumas situações, no entanto, ela se manifesta, como por exemplo citados pelas colaboradoras: no "ato de tocar no outro", entendido por elas como uma situação que promove o prazer, para quem toca e para quem é tocado, mas que no contexto diário da enfermeira é pouco ou nada realizado, e quando é feito, o é com uma frieza e um distanciamento do outro, à semelhança de uma máquina ou um objeto. Esta relação foi estendida também ao relacionamento existente dentro da própria equipe de enfermagem, que raramente promove contato físico entre si, ou qualquer outra oportunidade para expressar sentimentos.

Neste sentido há um trabalho (Sobral, 1994) que mostra que a enfermeira se apoia na técnica de enfermagem como um escudo, que lhe permite tocar o outro a partir de uma sucessão de passos e da impessoalidade.

Dessa feita o caráter da sexualidade, presente em todas as interações humanas é controlado, e o corpo da enfermeira, com um instrumento de prazer, é denegado.

Outra manifestação sobre sexualidade apontada na discussão grupal foi o modo de falar e expressar o seu corpo no dia-a-dia, ou de se comportar frente aos pacientes e colegas da equipe. É entendido por elas que a maneira de olhar, tocar, conversar e gesticular pode expressar carinho, afeto, aconchego, proteção, ou sensualidade e erotismo. Nessa direção atribuem ao "bom senso" o "controle" dessas manifestações para evitar "mal-entendidos" no hospital.

Referem também que os cuidados "sem exagero" com a boa apresentação é conveniente ao prazer do paciente que está sendo assistido, sendo um atributo necessário para o desenvolvimento do trabalho.

No entanto, não relacionam esse cuidado com a questão da sexualidade, a não ser que este se torne saliente provocando desconforto de colegas, críticas e preconceitos, como se fosse um elemento para chamar a atenção, para se "oferecer".

Foi também referida a questão da enfermeira manipular o corpo do outro com "seriedade" e "naturalidade", não demonstrando constrangimentos, nem emoções, parecendo que estava negando a presença da sexualidade (tanto sua quanto dos sujeitos do seu cuidado) e, vindo ao encontro do que é referido na tese de (Sobral, 1994) sobre sexualidade na enfermagem, não promovendo espaço para discussão a respeito deste tipo de situação (assim como sobre outros temas polêmicos) e que também é evidenciado no trabalho de (Figueiredo & Carvalho, 1999) quando mostram que a sexualidade é ainda considerada um tabu na enfermagem.

Este debate foi espontaneamente derivando para o segundo momento deste encontro, estendendo a discussão à exposição de suas próprias vivências, como alunas do Curso de Enfermagem, em relação à sexualidade.

Foram narradas algumas situações de preparação da turma para ingressar em aulas práticas no Hospital Universitário. Esse preparo visava orientar a respeito do comportamento que deveriam ter neste local, mais especificamente como deveriam trajar-se, o que poderia ou não ser usado, como conduzir-se no relacionamento com pacientes, familiares, equipe de saúde e demais alunos presentes.

As narrativas foram avolumadas de "nãos", ou seja, não pode fazer isso, não pode fazer aquilo..., finalizando com o comentário de uma das colaboradoras sobre a formação da enfermeira: "Começa por aí as proibições que nós mesmas nos colocamos." Expressaram também que não existe no curso oportunidade para discutir temas como sexualidade e outras questões relativas as suas próprias vivências como mulheres. Relataram situações em que o cuidado com o paciente exigia contato com suas partes íntimas, e como foram conduzidos estes momentos.

Evidenciaram o constrangimento já vivenciado a respeito de tal situação, e a penalização através de notas em aula prática, como contrapartida por este constrangimento, e por não ter tido uma atitude "natural" no evento, por parte de sua professora.

A partir destes relatos sugeriram algumas estratégias para tratar a questão da sexualidade no Curso de Enfermagem, como: criar uma disciplina alternativa, não obrigatória, ou um núcleo de estudos, que possibilite o espaço para debate acerca de temas da mulher, que compreenda questões de sexualidade, de gênero, violência, que envolva perspectivas culturais, históricas, sociais e políticas e que permita socializar suas próprias vivências, servindo esse espaço como um "respiradouro" e também como uma oportunidade de autoconhecimento; possibilitar aos professores do Curso de Enfermagem uma sensibilização e reciclagem para ajudar a conduzir situações que envolvam o tema da sexualidade, assim como outros temas polêmicos, como por exemplo, a morte; possibilitar discussões antes e após as aulas práticas, diariamente, avaliando as experiências vivenciadas e refletindo os encaminhamentos tomados.

As colaboradoras expressaram que o exercício do diálogo com colegas, professoras, enfermeiras, equipe de enfermagem e de saúde, deveria ser realizado constantemente na sua formação, possibilitando que essa prática se incorpore ao aprendizado quanto ao papel da enfermeira, como membro de uma equipe de trabalho, permitindo estendê-la para o seu dia-a-dia como enfermeira, num futuro próximo. Salientaram que é pelo exemplo que mais se aprende, e não somente pela teorização, e que estes devem sempre estar alinhados.

Quanto ao número de encontros autores (Victora, Knaut, & Hassen, 2000; Dall’Agnol & Trench, 1999; Westphal, Bogus, & Faria, 1996) referem que devem ser realizadas quantas sessões forem preciso de grupo focal para discutir e esclarecer questões, e (Barbosa, 1998) salienta que não devem ser colocadas muitas questões na mesma sessão, podendo dispersar ou cansar o grupo.

Nesse sentido, nesse 4º encontro, considerou-se que seria possível resgatar a questão da sexualidade velada na imagem da enfermeira e tratar conjuntamente com a forma como esse tema tem sido conduzido no Curso de Enfermagem, na formação dessas alunas.

Esse encontro permitiu constatar as características da flexibilidade de adaptação da técnica do grupo focal, às necessidades estabelecidas ao longo de seu desenvolvimento. Permitiu considerar ainda, essas características como ferramentas importantes para serem usadas, se necessário, não interferindo no processo de coleta de dados e oportunizando o esclarecimento e aprofundamento de questões.

O 5º encontro intitulado "Eu mulher x Eu estudante de enfermagem"

Objetivou proporcionar a revelação de diferenças de comportamento em relação a sexualidade, enquanto vivência individual como mulher e como estudante de enfermagem. Foi utilizada a técnica de modelagem com argila em dois momentos distintos.. No primeiro momento, para que elas representassem com argila "Como me vejo e me sinto como mulher?", e no segundo momento para que representassem "Como me vejo e me sinto como estudante de enfermagem?"

Cada um dos momentos teve a duração de 15 minutos para compor a representação e 30 minutos para apresentação e discussão. O tempo que sobrou, deste encontro (30 minutos) foram usados para abertura e explicações iniciais (+ ou - 5 minutos) e para o encerramento da sessão (25 minutos), onde foi feita uma síntese dos quatro encontros anteriores e seus objetivos e foi solicitado que as colaboradoras expressassem uma avaliação final considerando também os sentimentos e emoções percebidos, e o que este exercício havia representado para cada uma.

Retomando o resultado da modelagem em argila, verificou-se a satisfação como as pequenas esculturas foram aos poucos tomando vida, a partir das explicações de cada colaboradora. Em suas narrativas estavam presentes os sentimentos e as emoções de um "olhar para dentro de si mesma".

Nas representações de "Como me vejo e me sinto como mulher" foi relacionado: o "ser mulher" com a figura de um "leão", como sinônimo de força, de coragem e superação; como um "sol e um pássaro voando", representando luz, beleza e liberdade; como uma "flor" (esterlitza) expressando beleza e harmonia e ao mesmo tempo força e durabilidade; com um "coração" significando um ser muito sentimental e emotivo; e com uma "rosa com vários botões, para desabrochar e espinhos para protegê-la", representando a beleza, o que ainda está por vir, por conhecer, para amadurecer, e a proteção pessoal para viver no mundo.

No segundo momento dentre os trabalhos em argila figuraram: uma "escada em ascensão", relacionada a um ser em evolução, em busca do topo; uma "cabeça semi-aberta, com um lado cheio e outro a ser preenchido", significando a receptividade para receber conhecimentos, mas somente sendo atendida no plano do intelecto, expressando que, enquanto aluna de enfermagem há em sua formação um hiato em relação ao plano emocional, de autodesenvolvimento e autoconhecimento, como por exemplo, em relação a sexualidade; uma "mão estendida" representando a prontidão para oferecer e receber ajuda; "um cérebro, um olho, um ouvido, uma boca, uma mão e um coração agrupados próximos um ao outro", representando o acúmulo de conhecimentos e o raciocínio rápido, o observar e o saber ouvir para aprender, o poder de se comunicar, a possibilidade de ajudar os outros e de expressar e sentir emoções no seu dia-a-dia; e um "ovo sendo chocado num ninho" como sinônimo de acolhimento, construção e processo de amadurecimento que está sendo vivenciado enquanto estudante de enfermagem.

Este encontro não havia sido previsto no planejamento inicial do projeto-piloto. Entretanto, ao longo dos encontros houve a necessidade de encerrar este exercício de pesquisa com um trabalho que "costurasse" um pouco de tudo que permeou cada encontro.

Nesta direção, o debate demonstrou que as representações de "Como em vejo e me sinto como mulher" e "Como estudante de enfermagem?" estão relacionados a significação de sexualidade como uma relação do sujeito consigo mesmo e com o mundo, garantindo-lhe assim a dimensão de construção (Sobral, 1994).

Essa construção é o resultado de uma multiplicidade de fatores históricos, sociais e culturais integram a rede de significado social específico, possibilitando a manifestação de toda e qualquer expressão sexual, conforme o papel encenado em cada ato.

O debate evidenciou o entendimento de que a sexualidade atua na maneira como agimos, pensamos, sentimos, isto é, que ela está relacionada com todos os aspectos de nossa vida, como seres culturais que somos, nosso agir, pensar e sentir expressam os significados dentro de nossa visão de mundo, sendo revelada de acordo com a rede de significados específicos de cada grupo a que pertencemos. Por isso sua manifestação diferenciada nos diferentes modelos subjetivos do "eu me vejo" representados.

Esse encontro foi uma possibilidade de "amarrar" todas as discussões que fluíram nos encontros anteriores, permitindo consolidar idéias, esclarecer opiniões e retomar pontos de vista. O grupo sentiu que a interação entre elas se solidificou e que conceitos foram sendo construídos naturalmente, a partir de suas vivências, agora socializadas.

Avaliando a técnica... ou "rememorando o espetáculo"

Ao término deste exercício de pesquisa são "rememoradas" algumas características do grupo focal, percebidas ao longo dos "espetáculos", que mostraram a viabilidade desta técnica.

1. Embora as colaboradoras não tivessem experenciado aulas práticas no H.U. e, consequentemente tivessem pouco contato com enfermeiras assistenciais, elas possuíam no seu imaginário subjetivo, conhecimentos individuais latentes que elaborados e expressos no grupo, através de um processo interativo, culminaram na construção coletiva acerca do tema em estudo. Houve uma construção de conhecimento na verticalidade.

2. O número de sete participantes é considerado ideal por alguns autores (Debus, 1997) para aprofundar as idéias fluídas no grupo, e os critérios de seleção utilizados mostraram ser importante a intencionalidade da amostra, ou seja, as colaboradoras possuíam como traço comum ser do sexo feminino e aluna de graduação do Curso de Enfermagem da UFSM. Da mesma maneira as demais variáveis não interferiram na fluidez das discussões, havendo respeito e interesse de todas e por todas as idéias.

3. O primeiro contato com o grupo foi fundamental para estabelecer um clima de confiabilidade e desejo em participar projeto-piloto. Nesse sentido a apresentação do pesquisador ao grupo de colaboradores deve ser feita por alguém conhecido e de confiança deste, bem como deve ser usada uma linguagem clara e honesta criando um clima de segurança e interesse, os quais serão fatores essenciais para o aceite de cada participante à pesquisa.

4. Os momentos de preparação dos encontros visaram não só a organização destes, mas também criaram um clima de aconchego, conforto, descontração, serenidade e segurança para todas as participantes, e isso foi viabilizado em todas as sessões desenvolvidas.

5. A técnica de explosão de idéias é adequada quando se quer trazer a tona diferentes percepções, pontos de vista e pensamentos acerca de um assunto, sem a preocupação com censuras sobre certo ou errado.

6. No primeiro encontro, no qual buscava perceber as significações sobre sexualidade junto ao grupo, entendi ser preciso usar pequenos textos ou frases para ajudar o aquecimento da discussão. Em primeiro lugar porque o grupo estava iniciando um processo de interação e em segundo lugar porque o tema em discussão se apresentava ainda num plano bastante teórico, dificultando assim a expressão das idéias.

7. Compreendi que não era preciso preparar muitas perguntas para manter aceso o debate, mas sim conhecer o tema em discussão, ter claro o objetivo de cada encontro, e prestar muita atenção às narrativas de cada colaboradora, em consonância com o que recomenda (Debus, 1997).

8. O momento de seeting (contrato grupal) foi fundamental para estabelecer um compromisso ético bilateral no que diz respeito ao acontecer grupal, pois compreendeu regras básicas de convivência, facilitou a interação grupal e o comprometimento recíproco entre a pesquisadora e as colaboradoras.

9. Em vários momentos as colaboradoras se referiram a sexualidade como relação sexual. Entendo que o conceito de sexualidade pode compreender inúmeras significações, inclusive esta, mas o foco foi direcionado para um conceito que abordasse uma perspectiva antropológica, relacionando-o com a questão da cultura. Esse direcionamento aconteceu através da solicitação de exemplos de suas vivências, de pedidos de esclarecimento acerca das opiniões, de sintetização das idéias e retomada de conceitos averiguando se era essa mesma a idéia que elas pretendiam expor. Foram usadas técnicas de moderação sugeridas no trabalho de (Debus, 1997) como por exemplo: técnica escalonada, perguntas sobre aspectos encobertos, análise simbólica, técnicas projetivas, técnicas de convencimento. Logo, visando o entendimento de sexualidade numa abordagem cultural, este exercício do grupo focal foi pertinente para revelar dados, e ao mesmo tempo, possibilitou a avaliação de alguns questionamentos que foram aplicados e que deverão ser reformulados a luz destes resultados.

10. A técnica de colagem usada no 3º encontro foi adequada para revelar o estereótipo da imagem da enfermeira. Ao mesmo tempo possibilitou um momento de descontração para o grupo. Esse exercício apontou também para a necessidade de alterar a questão focal que conduziu a elaboração dos cartazes, caso se entenda necessário evidenciar o enfoque da sexualidade na imagem de enfermeira. Sabe-se por estudos já realizados sobre sexualidade na enfermagem, que esse domínio se encontra ausente das representações de imagens da enfermeira (Sobral, 1994; Figueiredo & Carvalho, 1999). Portanto, essa alteração dependerá do desejo da pesquisadora em relação ao encaminhamento de sua pesquisa. No entanto a revelação deste estereótipo confirmando trabalhos anteriores na enfermagem foi interessante e possibilitou seu resgate a partir da discussão no grupo focal, corroborando a condição de flexibilidade e adequação aos eventos que vão se conformando ao longo dos debates, permitindo esclarecimentos e aprofundamento do tema, assim como ocorreu no 4º encontro.

11. Outra possibilidade que o grupo focal traz e que foi viabilizado neste exercício, foi a identificação das percepções e significados das participantes do grupo e das dificuldades para trabalhar o tema em estudo na prática cotidiana deste, bem como de sugestões e propostas de modificação que partiu dos próprios sujeitos do contexto em estudo.

12. A vivência de aproximação que se instalou no decorrer dos trabalhos possibilitou a interação grupal, e isto foi uma condição de facilitação para o desenvolvimento das discussões, sempre num clima de respeito, compreensão, trocas, descontração e participação comprometida entre todos.

13. Em alguns momentos o foco de discussão foi desviado, sendo necessária habilidade e atenção para retomar o tema. Este é um risco que pode acontecer nesta técnica, devido o controle do grupo focal ser compartilhado entre o pesquisador (ou moderador ou coordenador) e as participantes (ou colaboradoras). Porém, como já foi citado anteriormente a concentração do moderador nas narrativas de cada participante e a sintetização das falas das colaboradoras, aliada a perguntas-chaves como: O quê? Por quê? foram suficientes para contornar essa questão.

14. A técnica de modelagem em argila foi adequada para a revelação das representações das vivências enquanto "Eu mulher" e "Eu aluna de enfermagem". A criatividade e a sensibilidade das colaboradoras foram surpreendentes também neste momento.

15. O 5º encontro não havia sido previsto no planejamento inicial deste projeto-piloto, no entanto devido as características desta técnica como flexibilidade e adequação de acordo com as necessidades do trabalho, ele foi viabilizado proporcionando um amarramento final as discussões, realizadas até então.

16. O grupo de colaboradoras salientou que esse tipo de atividade onde são compartilhadas informações, idéias, pontos de vista, opiniões, expressões de suas próprias vivências, havendo trocas e gerando a construção de um conhecimento não findasse com o término deste exercício de pesquisa, mas que se entendesse para outra atividade, como por exemplo já sugerido por elas como um grupo de estudo e pesquisa sobre temas de saúde da mulher (e que já está sendo providenciado).

17. O papel da observadora no grupo foi importante não somente pelo auxílio logístico à coordenadora (quanto ao manuseio do material de gravação, controle do horário e para captar as reações das colaboradoras) mas sua principal função foi sem dúvida o controle do desempenho da coordenadora, sua avaliação quanto aos encaminhamentos, e intervenção quando necessário para auxiliar em esclarecimentos e orientações, assim como seu parecer sobre cada encontro, servindo de motivação para as devidas elaborações e reelaborações subsequentes.

18. Nem todas as colaboradoras puderam participar de todos os encontros. Conforme combinado no contrato grupal elas poderiam faltar a 2 encontros no máximo, e deveria ser comunicado ao grupo sua desistência e ausência. Isso foi fielmente seguido e a ausência de colaboradoras em alguns encontros não prejudicaram o desenvolvimento do trabalho, uma vez que o tema sexualidade foi tratado em todos os encontros, havendo modificações quanto ao enfoque tratado em cada sessão, mas que conduziam um ponto comum, possibilitando rever depoimentos, acréscimos, fazer esclarecimentos e correções. Nesse sentido também a técnica do grupo focal foi considerada pertinente à coleta de dados.

19. Ao final de cada encontro fazíamos uma avaliação acerca dos sentimentos e sensações promovidos naquela sessão. Surgiam então relatos e referências quanto a importância deste exercício enquanto um espaço de autoconhecimento, auto-afirmação, revisão de conceitos e reflexão crítica a respeito das atividades cotidianas. Esse aspecto é considerado como uma das vantagens do grupo focal que conduz ao pensamento crítico e processo de desalienação.

Referências Bibliográficas

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Dall’Agnol, C. M., & Trench, M. H. (1999). Focal group as a methodological strategy in nursing research. Revista Gaúcha de Enfermagem 20 (1), 5-25.

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Figueiredo, N. M. A., & Carvalho, V. de. (1999). O corpo da enfermeira como instrumento de cuidado. Rio de Janeiro: Revinter.

Heiborn, M. L. (2000). Gender, sexuality & health. 9th ed. Programa de Estudos em Saúde Reprodutiva e Sexualidade. Campinas: Nepo.

Minayo, M. C. de S. (1993). o desafio do cohecimento. Pesquisa qualitativa em saúde (2nd Ed.). São Paulo: Hucitec.

Ressel, L. B. (1995). A cultura como mediadora da sexualidade da mulher rural. Unpublished Master’s thesis, Universidade Federal do Santa Maria.

Sobral, V. R. S. (1994). A purgação do desejo: Memórias de enfermeiras. Unpublished doctoral dissertation, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janiero, Brasil.

Victora, C., Knaut, D. R.; Hassen, M. de N. (2000). A pesquisa qualitativa em saúde: Uma introdução ao tema. Porto Alegre, Tomo Editorial.

Westphal, M.F. & Bogus, C. M. & Faria, M. de M. (1996). Focal groups: Pioneer research in health educational programs in Brazil. Boletim Oficina Sanitária Panamericana, 120, 472-481.

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IJQM Editor: Margareth Angelo